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Empreendedorismo
Ambiente de negócios no Piauí avança com leis e políticas públicas criadas nos últimos anos
No primeiro trimestre deste ano, 300 atividades econômicas tiveram alvarás ou licenças dispensadas no estado graças à melhoria em legislações
Robert Pedrosa e Nícolas Barbosa - redacao@pinegocios.com.br
É voz consensual entre a classe empresarial do Brasil que o poder público dificulta a vida de quem quer empreender. Os entraves são gerados pela complexidade das leis criadas no país e devido ao excesso de burocracia na obtenção de alvarás e autorizações para funcionamento dos negócios. No entanto, para reduzir a reclamação do setor e incentivar o empreendedorismo, o poder público, nos níveis federal, estadual e municipal, tem adotado ações, seja por meio de políticas públicas e ou mudanças em leis, para melhorar o ambiente empresarial no Brasil e no Piauí.
O Piauí Negócios fez um levantamento das oito principais leis, procedimentos e políticas públicas realizadas nos últimos dez anos para incentivar o empreendedorismo, como redução de burocracias, dispensa de alvarás, digitalização de serviços ou otimização do atendimento.
Junta Comercial permite abertura de empresas em até 30 minutos
Um dos órgãos que mais está no cotidiano dos empresários é a Junta Comercial do Estado do Piauí (Jucepi). O relacionamento começa no nascimento do negócio e esse momento tem sido foco de melhora por parte dos gestores piauienses nos últimos anos. Segundo a presidente da Jucepi, Alzenir Porto, desde que assumiu o órgão, em 2015, um dos objetivos foi aumentar a velocidade do registro das empresas.
O trabalho desenvolvido resulta, atualmente, em um tempo médio de abertura de 30 minutos (dependendo do tipo de empresa). Para atingir esse índice, a digitalização do processo foi fundamental. Apesar de a Jucepi atender apenas por seis horas nos dias úteis, o sistema Piauí Digital fica disponível 24 horas.
O órgão tem outros objetivos a serem atingidos para facilitar a vida dos empreendedores. “Estamos em contato direto com os órgãos estaduais para rever os procedimentos de emissão de licenças porque não é razoável o empresário esperar muito tempo por uma licença. Muitas vezes ele precisa do documento de imediato para a empresa começar a funcionar”, explica Alzenir Porto.
O empresário Ian Lobo é um exemplo das mudanças ocorridas na Junta Comercial. Em 2018, quando ele precisou, como advogado, de orientação para abrir a empresa de um cliente, foi necessário imprimir o contrato social, colher a assinatura de todos os sócios e ir fisicamente ao cartório reconhecer a firma. Ao abrir sua própria empresa (a franquia Fom) em 2022, Ian percebeu a diferença em apenas quatro anos.
“Demos entrada com a documentação dia 12 e no dia 15 de setembro já estávamos com o contrato social pronto. Quatro dias depois obtivemos a inscrição estadual e municipal. Isso tudo digitalmente, sem precisar a gente se deslocar fisicamente. O processo todo demorou então 7 dias, algo inimaginável antes”, afirma o franqueado Ian Lobo.
O contador Sávio Carvalho destaca que, com a implantação digital para abertura ou qualquer outra alteração nas empresas na Junta Comercial, houve uma melhora significativa. Antes dessa plataforma, segundo ele, demorava-se 30 dias para se abrir uma empresa e mais uns 60 dias para se conseguir emitir o alvará e as demais licenças de funcionamento. “Hoje se consegue abrir uma empresa e se obter o CNPJ em 24h. Isso desde que a SAAD (Superintendência de Ações Administrativa Descentralizada, de competência do município) em que a empresa está instalada seja eficiente. A nível estadual, a inscrição estadual, caso a empresa aberta ou alterada seja do ramo de comércio e os sócios estando regulares, sai cerca de duas horas após ser emitido o número do CNPJ”, afirma o contador.
No Piauí, 300 atividades econômicas tiveram o alvará dispensado no primeiro trimestre de 2023
Uma lei bastante comemorada pela classe empresarial foi a Lei de Liberdade Econômica (Lei Federal nº 13.874), sancionada em setembro de 2019. O artigo 3º, I, determina que atividades consideradas como de baixo risco não precisam mais de exigências, como alvarás e licenças, podendo funcionar assim que a empresa recebe o número do CNPJ.
No caso do Piauí, por exemplo, só nos três primeiros meses de 2023, 300 atividades econômicas tiveram o alvará de licença para funcionamento dispensado. Os dados fazerm parte do Ranking Nacional de Dispensa de Alvarás e Licenças do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (veja tabela abaixo).
Sávio Carvalho diz que a dispensa de alvarás beneficia não só empresas fundadas após a edição da lei, mas todas as demais. “Os alvarás eram atrelados às renovações das licenças e com a edição da lei deixaram de ser, ou seja, das empresas só passaram a ser exigidas somente as licenças, principalmente o Certificado de Regularidade do Corpo de Bombeiros. Já a Vigilância Sanitária e a Licença Ambiental passaram a ser emitidas sem burocracia”, afirma o especialista em contabilidade
O auditor independente Jorge Ivan reconhece que houve também uma melhoria significativa na evolução do Corpo de Bombeiro para atender às empresas. “Antes, tinha uma fila muito grande [para atender a demanda] e poucas pessoas trabalhando. Eles hoje são um bom exemplo de funcionalidade e evolução. O meu escritório, eles liberaram rapidamente”, elogia.
Para o tributarista Joaquim Caldas, entre as vantagens da Lei da Liberdade Econômica, estão as alterações no Código Civil que facilitaram a abertura e a estrutura societária. “No caso das empresas limitadas, não precisa mais ter dois sócios pra existirem, você pode ter uma sociedade limitada com um único sócio”, afirma o especialista.
A empresa Fom, a franquia de almofadas com designer ergonômico do empresário Ian Lobo, citada no início de reportagem, também é um exemplo das beneficiadas com a Lei da Liberdade Econômica. Como é considerada de baixo risco, ficou livre de exigências como alvarás do Corpo de Bombeiros ou Vigilância Sanitária.
Mais recentemente, em abril deste ano, o Governo do Piauí sancionou a Lei da Liberdade Econômica a nível estadual (lei n° 8025/2023), de forma a regulamentar algumas atividades no Piauí que precisavam de normas específicias. A legislação piauiense dispensa a necessidade de licenças e autorizações para 744 atividades econômicas consideradas de baixo risco
Em 2021, o Piauí foi considerado o 10º melhor estado para se abrir um negócio (gráfico abaixo). O dado é proveniente do Doing Business Subnacional Brasil 2021, um estudo realizado pelo Banco Mundial, que mede o ambiente de negócios para pequenas e médias empresas nacionais. No mesmo ano, foi constatado que, no Estado, o tempo médio de abertura de novas empresas era de 2 dias e 5 horas, o terceiro melhor do Brasil. Hoje, a média, como já informado, é de menos de 24 horas.
Com Sandbox Regulatório, Teresina se torna ambiente de testes para startups
Em nível municipal, tivemos várias ações para estimular os pequenos negócios. A mais recente delas, no dia 21 de março deste ano, foi a edição do Decreto Municipal que cria o SandBox Regulatório, que proporciona, dentro da cidade de Teresina, um ambiente de testes às startups - empresas inovadoras com crescimento escalável.
O documento estabelece diretrizes para a criação e funcionamento de um ambiente regulatório controlado no município, onde as startups poderão testar seus serviços, destinados ao poder público, antes de levá-los ao mercado.
“Este instrumento visa permitir com que empresas que trabalham com serviços inovadores possam fazer o teste previamente usando a cidade como uma plataforma, reduzindo riscos e permitindo que o produto seja validado em um ambiente mais real”, explica o coordenador do Espaço Thech da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (Semdec), José Bringel Filho.
De acordo com o coordenador, a Prefeitura de Teresina ficará responsável por apoiar o sistema de inovação, atraindo investimentos e empresas que possam crescer por meio de testes de validação. Já o empreendedor assume o investimento. “Será um processo acompanhado, pois há toda uma tramitação dentro dos órgãos que fazem parte do experimento. O investimento é feito pela empresa, o empreendedor deve assumir o risco, mas quanto mais apoio ele tiver nesse processo, maior será a chance de ele ter sucesso”, destaca.
Atualmente, 23 empresas do Brasil e do mundo lançaram propostas para testar suas soluções em Teresina. Os projetos estão sendo avaliados pela Prefeitura.
Desburocratização contribui para a construção civil gerar empregos em Teresina
Outras leis e ações municipais beneficiaram um dos setores econômicos que mais contribuem para a geração de empregos em Teresina, a construção civil. O presidente do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Piauí (Sinduscon), Guilherme Fortes, citou três mudanças que contribuíram para a construção civil continuar oferecendo postos de trabalho na capital nos últimos anos.
“A primeira foi o alvará mais célere. Foi identificado que 70% dos alvarás de Teresina eram para habitações abaixo de 500m². E aí foi aprovado um decreto (21.092/2021, que regulamentou a Lei 5.295/2018) em que a gente teria um alvará. para unidades abaixo de 500m², com uma análise mais célere”, explica Guilherme Fortes. A mudança na legislação permitiu que o documento de liberação da construção tenha passado a ser emitido em apenas quatro dias.
Uma segunda medida tomada no setor de construção civil foi uma adequação no Plano Diretor de Ordenamento Territorial (PDOT) de Teresina que facilitou a construção de habitações de interesse social, que é a modalidade que inclui as pessoas mais pobres. Segundo o presidente do Sinduscon, o plano da capital exigia lotes de 600m² para essa modalidade, enquanto a legislação federal só recomendava 175m². As alterações promovidas pela Prefeitura e pela Câmara Municipal viabilizaram o retorno desse tipo de construção em algumas regiões da cidade.
Ainda como iniciativa para viabilizar as obras para a população mais pobre, foi regulamentada a cobrança da outorga onerosa em Teresina no segundo semestre de 2022. Esse mecanismo de arrecadação é utilizado em diversas cidades brasileiras e cria um fundo para construções de baixa renda com recursos pagos para a ampliação de edificações em áreas mais valorizadas. O Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU Habitat) reconhece a outorga onerosa como uma forma de democratizar o espaço urbano.
Essas decisões da Prefeitura de Teresina têm gerado resultado e podem ser confirmadas pela geração de empregos. “Isso pode se conferir pelo Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), pelas pessoas que estão empregadas. Em Teresina nós não tivemos redução, pelo contrário, um aumento das pessoas no setor da construção civil trabalhando. Isso contraria várias cidades do país, que tiveram redução”, explica Guilherme Fortes. Ele acrescenta que o setor da construção civil ainda aguarda a resposta da Prefeitura para propostas de adequações do Programa Minha Casa Minha Vida e à Lei do Centro Vivo, que pretende viabilizar construções no centro da capital.
Com Programa Cidade Empreendedora, Sebrae tenta reduzir burocracia nos municípios
Referência como a principal entidade privada do Brasil voltada para o empreendedorismo, o Sebrae criou em 2021 o Programa Cidade Empreendedora, uma iniciativa para melhorar o ambiente empresarial junto ao setor público. O foco do programa são os municípios, que têm mais dificuldade em implementar políticas que facilitem o empreendedorismo.
A estratégia do programa parte de uma visão sistêmica do território, mas com atuação direta junto ao poder público, para que este seja um agente mobilizador, facilitador e fomentador do desenvolvimento. O Programa trabalha dez eixos: Gestão Municipal; Lideranças Locais; Desburocratização; Sala do Empreendedor; Compras Governamentais; Empreendedorismo na Escola; Inclusão Produtiva; Marketing Territorial e Setores Econômicos; Cooperativismo e Crédito; e Inovação e Sustentabilidade (veja gráfico abaixo).
Um dos eixos mais visíveis do programa é Sala do Empreendedor, espaço físico para prestação de serviços que vão desde a orientação empresarial básica até a tramitação de documentos e processos relativos ao funcionamento regular das empresas. Segundo o gerente da Unidade de Políticas Públicas e Desenvolvimento Territorial do Sebrae no Piauí, Helder Freitas, 112 municípios do Piauí já possuem a sala, o que representa metade das 224 do Estado.
Outra ação importante do Sebrae como política pública é o agente territorial Sebrae, o ATS. Trata-se de um profissional definido pelo Sebrae que vai ao município para organizar e definir ações públicas voltadas para o empreendedorismo. “Pouquíssimos municípios não têm atuação do agente territorial Sebrae hoje”, diz Helder Freitas.
Além das iniciativas, o Sebrae também atua na discussão de políticas públicas para melhorar o ambiente de negócios. A entidade faz parte do subcomitê da Rede Sim, formada por instituições que atuam no aperfeiçoamento do habitat empresarial. No Piauí, fazem parte, além do Sebrae, o Corpo de Bombeiros, Vigilância Sanitária, a Secretaria da Fazenda, a Junta Comercial do Piauí, a Agência de Defesa Agropecuária, a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e a Investe Piauí.
Além disso, o Sebrae, em parceria com a Junta Comercial do Piauí (Jucepi), é a aprimoração do programa Piauí Digital nos 20 municípios do Piauí com maior número de empresas abertas. O objetivo é dar mais agilidade aos processos de registro de empresas por meio da tecnologia, a exemplo do que acontece com a Jucepi.
Até agora, já foi concluído o processo em 12 municípios: Água Branca, Bom Jesus, Campo Maior, Canto do Buriti, José de Freitas, Oeiras, Pedro II, Picos, Piripiri, São João do Piauí, São Raimundo Nonato, Uruçuí.
Apesar dos avanços, ainda há entraves burocráticos na Prefeitura de Teresina
Mesmo com avanços em nível municipial, a Prefeitura de Teresina mantém muitos entraves burocráticos que atrapalham o ambiente de negócios. Entre os alvarás dispensados de acordo com as leis federal e estadual da Liberdade Econômica, Teresina está entre as capitais que mais exigem alvarás de funcionamento para abertura do empresas.
No mesmo ranking do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços que apontou a dispensa de alvarás de 300 atividades econômicas a nível estadual, em Teresina a dispensa de alvarás é em apenas 286 atividades econômicas, enquanto que as primeiras colocadas dispensam bem mais: Vitória liberou licenças de 620 atividades econômicas; Campo Grande, 612 e Florianópolis. 575. A maoria das capitais avaliadas dispensou uma média de 300 alvarás.
“Em Teresina a maior dificuldade está na liberação de acessibilidade. Eles criam muitas normas que impedem a operação da empresa”, afirma o contador Sávio Carvalho. Segundo o especialista, geralmente as atribuições de liberação de vistoria, fiscalização ou até mesmo de acompanhar os processos encaminhados do site Piauí Digital são centralizadas em um único servidor, o que em muitos casos ele fica sobrecarregado, chegando a liberar uma consulta prévia após 30 ou mais dias da sua solicitação.
“Eu mesmo tive uma empresa dado entrada em 05/01/2023 na SAAD e o mesmo foi cancelado pelo sistema por não ter tido movimentação por 90 dias, mesmo eu estando indo na SAAD e pedindo providências. No setor havia quatro servidores, mas o responsável pelos processos estava de férias. Essa é a nossa realidade”, lamenta Sávio Carvalho.
O auditor independente Jorge Ivan esclarece que a Lei da Liberdade Econômica depende da adesão de estados e municípios para poder ter efeito. Uma das críticas que Jorge Ivan faz é à Secretaria de Meio Ambiente de Teresina, que carece de estrutura. “Não tem ferramenta tecnológica nem estrutura física, depende de poucos fiscais. Em alguns casos demora até seis meses para emitir licenças”, reclama.
Novas leis em andamento: reforma tributária e Lei da Inovação Municipal
Apesar das várias mudanças positivas para as emrpesas como todas essas ações, há ainda muitas outras legislaçães a serem melhoradas. Atualmente, estão em discussão a reforma tributária, de atuação nacional, e a Lei da Inovação Municipal de Teresina, esta última já em fase final de aprovação.
O advogado empresarial André Lins, presidente da Associação de Jovens Empresários do Piauí (AJE-PI), aposta na reforma tributária como modificações na lei para beneficiar os pequenos negócios. Ele aponta que a maioria das empresas no Brasil não consegue sequer sobreviver e que talvez um dos motivos seja a tributação já na fundação da empresa. “A gente espera que no texto final que venha a ser aprovado existam previsões que visem desonerar tributariamente o nascedouro das empresas. Isso para que se consiga alimentar, incentivar e nutrir das empresas. E aí o governo tributaria num momento posterior, onde ela já esteja consolidada”, sugere o advogado.
Já a Lei da Inovação Municipal de Teresina é mais direcionada às startups, por serem negócios que trabalham com ideias inovadoras. O objetivo é ter uma política constante em nível municipal que incentive a fundação de empresas de inovação.
A legisltação cria um conselho municipal para discutir e definir políticas públicas, a concessão de subsídios fiscais e a redução de 50% no IPTU para empresas de inovação que instalarem sua base no centro de Teresina, de forma a ajudar a revitalizar a região.
A medida prevê ainda a conversão de tributos de empresas que queiram “apadrinhar projetos de inovação”, de forma que elas possam reverter esses tributos municipais em valores que vão ser aplicados por um projeto de startup.
Segundo Bringel Filho, a minuta da lei já teve discussões dos atores do ecossistema em Teresina, passou pelo crivo da Secretaria Municipal de Desenvovimento Econômico e agora está na Procuradoria Geral do Município para análise jurídica. “A previsão é que o projeto siga para Câmara Municipal ainda neste mês de junho, para aprovação no máximo no segundo semestre”, espera Bringel.
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